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«Viva o bom senso?»

05 de Maio de 2025

Daniel Zumelzu Mouta

Daniel Zumelzu Mouta

«Viva o bom senso?»

A tomada de posse de Trump, no dia de 20 de Janeiro último, representou para os conservadores uma enorme esperança, não só nos Estados Unidos como ao redor do mundo. Parecia que a sombra das posições ditatoriais e os delírios dos próceres implementadores de uma agenda estranha tinha chegado ao fim ou pelo menos feito uma «pausa». Mal chegou ao poder, Trump já pôs ordem na casa e soube muito bem onde e como agir. As suas ordens executivas foram ao âmago de muitas e sérias questões. E nisso devemos admitir que Trump acertou em cheio.

Trump afirmou que a sua vitória nas eleições foi a vitória do «bom senso». Confesso que acreditei e fiquei bastante entusiasmado com essa declaração, que seria um autêntico freio a esta nova religião que nascia no Ocidente: o wokismo [1]. Se não fosse um travão, ao menos seria um generoso balde de água fria nas intenções dessa «turma».

Contribua com qualquer valor para o site "Cristãos Atrevimentos" Quero Doar Entretanto, a desconcertante cena no salão Oval da Casa Branca, envolvendo Zelensky, o Presidente Trump e seu vice J.D Vance, deixou o mundo e os seus aliados no Ocidente em autêntico suspense. Muitos canais da comunicação informaram que o presidente ucraniano «foi convidado a retirar-se» da Casa Branca a pedido de Trump. A cena foi realmente grave. Muito grave.

Nos dias que se seguiram, nas redes sociais as opiniões foram violentamente contrárias ou favoráveis a Trump e «rios de bytes» correram pela comunicação social, em especial no antigo Twitter. Confesso que nunca pensei que Trump e seu vice protagonizassem tão vergonhosa cena. Que a bem da verdade, os mal-educados e desprovidos de qualquer senso de razoabilidade e sentido de homens de Estado foram J.D Vance e o próprio Trump. Tratava-se de algo inédito nos nossos tempos, de um cenário que nem mesmo nas mais ácidas tensões da Guerra Fria foi destilado com a mesma intensidade que a cena na Sala Oval.

Não será à toa que muitos russos, inclusive os propagandistas do Kremlin tratam os americanos de «pindós» [2], uma palavra que se refere a camponeses rudes. Dentro da arte da diplomacia pode-se dizer tudo e fazer tudo, e inclusivamente sobreviver-se a tudo, mas tem de haver «savoir faire» para tal – Talleyrand que o diga.

Nos dias seguintes ao incidente, quando abri o «X» (antigo Twitter), deparei-me com um chorrilho de opiniões amargas, duras, mentirosas e desonestas, inclusive de pessoas amigas, e de conservadores que até então achava que tinham os pés bem fincados no chão, como foi o caso da Brigitte Gabriel e outros conhecidos, que além das críticas, postaram autênticos insultos nos seus perfis.

Confesso que, ver o que vi, causou-me certo embaraço, pois pensava que esse tipo de ofensa gratuita estava reservado às fileiras da esquerda raivosa. Aqui notei claramente que as pessoas não conseguiram diferenciar as situações. É necessário separar as coisas para não cairmos na desumanidade, tal e qual muitas figuras políticas que alardeiam o «desrespeito às instituições» em detrimento do sofrimento humano – no Brasil que se diga.

Zelensky pode ter vários defeitos. Mas creio que não devemos ofender ou sabotar a sua causa que é a defesa da integridade territorial da Ucrânia e defesa do seu povo. Quisera que os europeus tivessem o mesmo afinco e disponibilidade de ânimo para defender as suas pátrias da mesma forma que os ucranianos dão a sua cara ao fogo das armas russas.

Os nossos conservadores negam a realidade de que a Ucrânia foi invadida e é vítima, à semelhança do que fazem os revolucionários wokistas quando insistem em não ver certas realidades?

Será que nos nossos dias estamos a ver velhos soberanistas na Europa e nos Estados Unidos apoiando a partilha da Ucrânia em face dos seus inimigos? Será que vemos defensores da propriedade privada assistir à «legalização» do assalto que se pretende fazer na Ucrânia?

O mais interessante viria nos dias a seguir. As concessões que Trump quer fazer à Rússia, são tão grandes e abrangentes que fariam Alexander Kerensky corar de vergonha. Muitos alegam que isso faria parte de uma estratégia de Trump para afastar a Rússia da influência chinesa. Confesso que não sei quem aqui está a ser ingénuo ao ponto de acreditar em tal história. Pois tanto a Rússia como a China desejam a mesma coisa: o fim da hegemonia dos EUA e o seu subsequente desaparecimento.

Outro fenómeno curioso que pude perceber foi o coro uníssono e a uniformidade das ofensas e críticas que fizeram a Zelensky. Que estranho fenómeno foi esse? Que propagação viral foi essa, de uma histeria tão característica da esquerda quando quer executar o assassinato de reputações? Era claro. As provas abundavam no Twitter. Bastava ver como as publicações de Medvedev e de Dugin, mas também as de congressistas americanos, escancararam uma realidade da qual certas pessoas há muito desconfiavam: propaganda russa infiltrada.

O «modus operandi» do acto demonstrou que era algo bem típico das agências de desinformação. E dentro desse contexto, relembro aqui uma declaração do jornalista e historiador Paul Johnson, que no seu livro «Heroes» (2009), afirmou categoricamente que a União Soviética, furiosa com o facto de Pinochet ter derrubado Allende e ter assim evitado que o Chile se transformasse em satélite da União Soviética, fez com que a KGB perpetrasse a mais furiosa difusão propagandística com o fim a demonizar Pinochet nos meios intelectuais de todo o mundo. Com êxito, e segundo as palavras de Johnson: «foi o último triunfo da KGB antes de ser posta na lata do lixo da história» [3].

Achei estranho, suspeito e de mau tom esse coro uníssono de ofensas e depois os que pretenderam mitigar a cena reduzindo-a a uma querela. Uma coisa é endossar apoio às boas acções de Trump, outra coisa é ter independência e bom senso para se pensar pela própria cabeça e não pelo que nos diz a propaganda manipuladora. A Direita deve estar preparada para esta espécie de escrutínio dentro das suas próprias fileiras. Se não, arrisca-se a parecer com os antigos comunistas da URSS, que diziam «que nós não precisamos pensar por nós mesmos, o Camarada Stalin por sí só é suficiente».

Outra pérola que devo assinalar foi a das declarações do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, que deixou muitos monárquicos húngaros de cabelos em pé quando se referiu à União Europeia afirmando que ela «está a abusar do poder e quer fazer a mesma coisa que os delegados da Corte Imperial de Viena fizeram connosco». Sério? No seu deslize, Orbán escandalizou os monárquicos, demonstrando aversão à Monarquia e manifestando aquele ódio republicano e igualitário tão característico dos revolucionários. Parece que Orbán já se esqueceu do que a Hungria sofreu sob o imperialismo comunista da Rússia e do que «os delegados da corte soviética» fizeram ao seu país. Achei essa declaração extremamente reveladora, pois o ódio à monarquia imperial dos Habsburgos sempre foi vivamente manifestada por comunistas ou nazistas. Isso nunca falha.

Diante disso, só posso acreditar em duas opções: ou a Direita Ocidental foi enganada ou parte dela é cúmplice nesse jogo. O tempo será senhor da razão, mas pode-se perguntar se isso tudo não será também mero amadorismo de iniciante. Se assim for, tanto as ofensas dirigidas a Zelensky como o deslize de Orbán mostraram certo amadorismo, com mesclas de infantilidade e imaturidade, bem típicas de quem não pensa por si só. Isso não foi uma demonstração de bom senso.

Muitos conservadores ainda demonstram que não estão minimamente qualificados para o confronto aberto quando deparados com as tácticas das cartilhas bolcheviques, ainda que elas tenham sido «recicladas» e «polidas» com doses de monarquismo, valores familiares e bons costumes. Em suma: um conservadorismo de ocasião para controle do público interno russo, mas que agora parece ter contaminado a direita ocidental.

Já os conservadores da velha-guarda, os que estudaram a fundo o movimento revolucionário, conhecem as tácticas, os engodos e as artimanhas urdidas pelos bolcheviques para criar na cabeça das suas vítimas um labirinto que destrói o pensamento lógico e conduz à cegueira.

Uma velha máxima popular, diga-se passagem, revestida de uma verdade inexorável, que mostra bem a sabedoria dos antigos, rezava que «de tubos de esgoto não saem filetes de água limpa». Assim também neste caso parece que o bom senso de muitos conservadores falhou miseravelmente ao aceitar as tresloucadas filosofias e os argumentos do «conservadorismo da KGB».

 

 

Notas:

[1] Jean-François Braustein – Professor de Filosofia Contemporânea na Sorbonne, denunciou os excessos do wokismo no seu livro: “A Religião Woke”.

[2] https://en.wikipedia.org/wiki/Anti-American_sentiment_in_Russia#Pindos

[3] http://www.impreso.diarioeldia.cl/opinion/columnas/pinochet-heroe-paul-johnson

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