O contra-revolucionário deve ter uma concepção militante da vida espiritual. Vita Militia est! Que a vida de um católico seja um combate é um dos conceitos sobre os quais mais insiste o Novo Testamento, sobretudo nas epístolas paulinas. Afirmou o Apóstolo da espada que a substância e o fundamento de toda a vida cristã consiste em não secundar os costumes corruptos do século mas em combatê-los e resistir-lhes com constância.
A espiritualidade ignaciana, por sua vez, afirma que a alma de qualquer homem é um campo de batalha, no qual pugnam o bem e o mal. O pecado original teve como consequência as inclinações desordenadas que convidam ao pecado. O demônio procura favorecer tais inclinações… a graça de Deus ajuda a vencê-las transformando a vitória em ocasião de santificação. Nessa luta o livre arbítrio humano é o fiel da balança!
O que, de alguma forma, serve para compreender a luta de todo o católico; auxilia na percepção da vocação muito especial do contra-revolucionário. Auxilia repito, pois na verdade a vida do contra-revolucionário se distingue em alguns aspectos, tendo as suas especificidades.
A sua vida espiritual está vinculada à sua actividade quotidiana de combate à Revolução, que odeia com todas as veras da sua alma; e de exaltação da Contra-Revolução que ama com maior vigor. Tal se dá em pequenas coisas, assim como nas mais relevantes de sua vida. Desde o traje até à liturgia da Santa Igreja… à guisa de exemplo.
O que é um contra-revolucionário? Tal questão foi respondida de forma magistral por Plinio Corrêa de Oliveira em seu ensaio Revolução e Contra-Revolução:
Pode-se responder à pergunta em epígrafe de duas maneiras:
1.Em estado atual
Em estado atual, contra-revolucionário é quem:
- Conhece a Revolução, a Ordem e a Contra-Revolução em seu espírito, suas doutrinas, seus métodos respectivos.
- Ama a Contra-Revolução e a Ordem cristã, odeia a Revolução e a anti-ordem.
- Faz desse amor e desse ódio o eixo em torno do qual gravitam todos os seus ideais, preferências e atividades.
Claro está que esta atitude de alma não exige instrução superior. Assim como Santa Joana D´Arc não era teólogo mas surpreendeu seus juízes pela profundidade teológica de seus pensamentos, assim os melhores soldados da Contra-Revolução, animados por uma admirável compreensão do seu espírito e dos seus objetivos têm sido muitas vezes simples camponeses, da Navarra, por exemplo, da Vendéia ou do Tirol.
2. Em Estado Potencial
Em estado potencial, contra-revolucionários são os que têm uma ou outra das opiniões e dos modos de sentir dos revolucionários, por inadvertência ou qualquer outra razão ocasional, e sem que o próprio fundo de sua personalidade esteja afetado pelo espírito da Revolução. Alertadas, esclarecidas, orientadas, essas pessoas adotam facilmente uma posição contra-revolucionária. E nisto se distinguem dos semi-contra-revolucionários…
Aproveito para definir o semi-contra-revolucionário: Também é filho da Revolução. Note-se que circunstâncias ou coincidências – como uma educação em meio fortemente tradicionalista e moralizado – fazem-no conservar em um ou muitos pontos uma atitude contra-revolucionária. Contudo, a sua mentalidade já está marcada pelo espírito da Revolução, que predomina. As suas actitudes tradicionais são um atavismo ou mesmo um mero arqueologismo.
Cumpre afirmar perentoriamente que a Revolução é um movimento de revolta. Mas de revolta contra uma ordem: a ordem edificada pela Civilização Cristã. O seu motor, a sua força propulsora encontra-se em tendências desordenadas que buscam a sua afirmação. Os valores metafísicos da Revolução são o Orgulho e a Sensualidade – entendidas no sentido dos autores espirituais, ou seja, como paixões desordenadas. Tais valores exprimem com rigor o espírito da Revolução na busca da igualdade absoluta e da liberdade completa.
O orgulho – espécie de sensualidade da alma – busca a igualdade absoluta.
A sensualidade – espécie de orgulho do corpo – busca a liberdade absoluta.
O progresso e a decadência na vida espiritual do Contra-Revolucionário estão submetidos à luta diuturna contra as paixões desordenadas; tal combate harmoniza o invisível e o visível. A luta espiritual produz frutos no mundo: eis a verdadeira acção contra-revolucionária. O embotamento da alma chamada à Contra-Revolução dá-se quando triunfa a paixão desordenada… e tal pode se dar de inúmeras maneiras, como por exemplo a vida medíocre, alimentada pelos interesses pessoais e pela mesquinhez das bagatelas que absorvem o quotidiano – verdadeira tentação é a vida medíocre! Vida na qual as ideias de renúncia, generosidade, nobreza, grandeza ou sacrifício são consideradas irrelevantes ou mesmo irritantes.
A Alma do Contra-Revolucionário
Importa realçar que é preciso não ceder à tentação do activismo.
O apostolado é condição essencial do Católico. Também é do Contra-Revolucionário em sua especificidade. Mas a heresia do activismo, denunciada por Dom Chautard na sua exímia obra intitulada A Alma de todo o Apostolado, deve ser encarada com seriedade. Tal heresia foi condenada por Pio XII na sua exortação apostólica Menti Nostrae na qual afirmou que a heresia da acção é aquela que não tem os seus fundamentos nos auxílios da graça, e não se serve constantemente dos meios necessários a obtenção da santidade, que Nosso Senhor nos proporciona…
Sobre este tema perdoem-me um exemplo pessoal:
Poucos meses antes da morte do Professor Plinio Corrêa de Oliveira, em 1995, tive a honra de ter uma conversa um tanto demorada com este mestre da Contra-Revolução em São Paulo. Lembro-me que, então, no ardor da minha juventude, coloquei-me à disposição para colaborar nas lides contra-revolucionárias. O Doutor Plinio apontou nessora para um pequeno retrato e disse que admirava profundamente aquele homem que, através da sua acção, defendera e sustentara a Cristandade num momento de grande crise. Tratava-se de um retrato de Santo Ignácio de Loyola. A referência a este fidalgo espanhol não era meramente circunstancial. A acção de Santo Ignácio entre a elite universitária – donde nasceram os jesuítas – incitava à compreensão da importância desse apostolado. Era na vida sobrenatural, vivida nos Sacramentos e nos Exercícios Espirituais, que emanava toda a força de vida activa do grande fundador, heróico defensor da ortodoxia católica. Recordo o fundador da TFP a mencionar o fundador dos jesuítas nesses termos: se a minha obra fosse destruída, recomeçaria tudo no mesmo dia! A lição era justamente compreender que da força da vida interior é que surgirá a acção, a obra que deverá satisfazer as necessidades da vocação contra-revolucionária.
Ao final da minha última causerie com o Doutor Plinio, lembro-me ainda das suas palavras, sábias e marcantes:
«Muitos estão disponíveis para agir pela Contra-Revolução; menor é o número daqueles que estão dispostos a rezar pela Contra-Revolução; muito menor ainda é o número daqueles que estão prontos e dispostos para sofrer pela Contra-Revolução.»
Não resta dúvida que a seiva da acção contra-revolucionária está na vida sobrenatural, na vida de oração, na frequência aos sacramentos e na disposição de se imolar, se preciso for, para servir à grande causa contra-revolucionária: a Restauração da Civilização Cristã.
Seguramente não será do imanentismo de uma filosofia da práxis, por exemplo, que renascerá a Civilização Cristã. A conversão, a transformação interior, produzirá verdadeiras acções para restaurar a Ordem. E por Ordem entenda-se a ordem monárquico-aristocrática enformada pela doutrina Católica, sem concessões ao mundo moderno. Ou seja, o Reinado Social de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Por outro lado, o sintoma característico da decadência na vida espiritual do contra-revolucionário é a indolência, que se expressa pelo entibiamento do Amor pela Santa Igreja, Mãe e Mestra da Verdade. Começa a ceder, transigir, calar e acomodar-se perante os ataques dos filhos das trevas. É como uma tuberculose da alma. Mina profundamente a vida espiritual.
Do minor ao maior, observamos a apostasia das nações ocidentais, minadas pelo laicismo ou pela tibieza de um clero decadente.
A vida Claustral
Gostaria de ainda salientar um aspecto da Civilização que irá surgir da ruína do mundo moderno. Refiro-me à vida claustral e a sua profunda imersão na contemplação e no aperfeiçoamento das virtudes cristãs. O claustro é uma poderosa arma na luta contra-revolucionária. Assim como a alma da Idade Média foi Cluny, e Cister está na essência da criação do Reino de Portugal, a restauração da ordem estará marcada pela vida monástica.
Os revolucionários odeiam o claustro. Perseguiram-no em todo o mundo pelas diversas correntes da historicidade da Revolução. O liberalismo, por meio dos sofismas os mais repugnantes, violou as ordens contemplativas. Sabe que uma sociedade sacralizada e hierarquizada depende radicalmente da vida claustral.
Uma espécie análoga que deverá ser restaurada é a do claustro universitário, pois será do estudo silencioso e fiel à Verdade é que poder-se-ão renovar todas as coisas.
Conclusão
A dinâmica da Contra-Revolução está na força de alma dos contra-revolucionários. A inteligência é iluminada pela Graça e as acções são suscitadas, produzindo os seus frutos. É, portanto, a prática da virtude que suscita as acções autenticamente contra-revolucionárias. A alma se eleva das bagatelas e misérias da vida para atingir o seu verdadeiro fim.
Para aqueles que foram chamados a combater, no século XXI, contra um processo revolucionário multissecular, que tem o seu dinamismo num ódio metafísico contra a hierarquia e contra a pureza, faz-se mister o exercício da mentalidade hierárquica e a busca incessante da pureza. A padroeira da Contra-Revolução é Nossa Senhora!
A maneira de agir, então, será nobre e eficiente, preparando os novos prodígios que irão fazer História, prodígios que se revelam quando os Homens são fiéis e correspondem às Graças do Deus Todo-Poderoso.